bárbara schall
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constelação II - a fenda
Certa vez caminhei longamente por um deserto
até chegar a uma cratera muito profunda. Uma cratera no meio do mundo e ali eu era só corpo; fiquei por um longo tempo, escutando os ecos do movimento do vento no chão, até me transformar em uma caixa de ressonâncias, por onde tudo entrava, e me preenchia como uma ventania, um movimento de percussão que vibrava na fricção da minha matéria com a matéria desse território, gerando ecos carregados de histórias e acontecimentos.


Era um corpo de passagem. De repente senti que havia permitido que as coisas chegassem até mim; sem perguntar o que elas significavam permiti que aparecessem; tornei-me parte do território.
Escutava esse barulho seco do estilhaço e sentia que pisava em ossos, camadas finas de ossos, ressequidos, que se rompiam com o peso de uma presença. O som do caminhar é também uma música ritmada afinal.

Ali eu abria fraturas espaço-temporais entre corpo- sensível e território-testemunho, apreendia em devires de petrificação.

Subindo a cratera, novamente para olho na linha do horizonte, meu corpo pesa. Andava e a camada fina de rochas sedimentadas se rompia.
Momento breve do encontro. Feche os olhos, aguce seus ouvidos.
O que você escuta?
É preciso andar certo tempo, ter paciência de deixar a lentidão da emergência e do desaparecimento crescer em você .
fotografias realizadas no caminho dos incas, quilágua, atacama, chile.

impressão mineral em papel de algodão. tamanhos variáveis. 2018
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Tornar-se, entrar na paisagem como uma lâmina através de tudo. Não estamos no mundo, tornamo-nos com o mundo, em presença, fazendo com. Somos também inscrição, somos encontros dinâmicos de memórias e matérias, devir sensível.
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